DOL - Dor On Line

Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP

Universidade de Brasília - Campus de Ceilândia
Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto - USP
Faculdade de Farmácia - Universidade Federal da Bahia

Principal    |    Editoriais    |    Edições    |    Sobre a Dor    |    Glossário    |    Projeto DOL    |    Publicações    |    Contato

   
 

Editorial do mês

 

 

Como a inteligência artificial pode melhorar o controle da dor durante o período perioperatório dos pacientes?
Karolina Oliveira Gomes e Marta Oliveira de Araújo *

 

O anestesiologista tem um papel essencial antes, durante e depois das cirurgias. Ele avalia os pacientes previamente, garante sua segurança durante o procedimento e cuida do conforto no pós-operatório [1]. Apesar dos avanços na redução de mortes durante a cirurgia, as complicações após o procedimento ainda são comuns, e o tratamento cirúrgico continua caro [2,3]. A anestesia geral é necessária para algumas cirurgias, garantindo que o paciente fique inconsciente, sem dor e com os músculos relaxados. O controle da dosagem dos anestésicos é essencial para evitar problemas como o paciente acordar durante a cirurgia ou ter alterações perigosas na pressão e nos batimentos cardíacos [4].

 

Nos últimos anos, a tecnologia tem ajudado a tornar os cuidados anestésicos mais seguros. A inteligência artificial (IA), o aprendizado de máquina e big data já são usados em diversas áreas da medicina e começam a ser aplicados também na anestesia [5,6,7,8]. A IA é um conjunto de sistemas que aprendem e tomam decisões baseadas em grandes quantidades de informação [9]. Na anestesia, isso pode ajudar a prever a dosagem ideal de medicamentos e a monitorar os pacientes em tempo real.

 

A história da IA na anestesia começou há algumas décadas, com programas que auxiliavam os anestesiologistas na administração de medicamentos e no monitoramento dos pacientes. Um dos primeiros exemplos foi o "Diprifusor", desenvolvido no final dos anos 1990, que automatiza a infusão do anestésico propofol, garantindo a dose correta [10,11]. Outro avanço foi o sistema "CLAD" (closed loop anaesthesia drug administration), que ajusta automaticamente a dosagem de anestésicos para manter o paciente no nível ideal de sedação [12,4].

 

Com o tempo, esses sistemas ficaram mais sofisticados. O "McSleepy" é um exemplo mais recente, capaz de controlar simultaneamente a sedação, a analgesia e o relaxamento muscular, administrando medicamentos com base em sinais clínicos como índice bispectral (BIS) e escala analógica de dor [13,14]. Já o "SEDASYS" é um sistema automatizado que administra sedação leve a moderada sem necessidade de um anestesiologista presente [15]. Do mesmo modo, robôs estão sendo desenvolvidos para auxiliar na anestesia regional, oferecendo mais precisão, como o Magellan, um braço robótico usado no treinamento de anestesia guiada por ultrassom [16].

 

A IA também está sendo usada para prever a necessidade de analgésicos e melhorar o controle da dor após as cirurgias. Pesquisas recentes indicam que algoritmos de aprendizado de máquina podem prever a dosagem ideal de opioides e identificar pacientes que precisam de um acompanhamento especial para o controle da dor [17]. Além disso, um estudo analisou imagens cerebrais para diferenciar estímulos dolorosos e não dolorosos, mostrando que a IA pode ser mais precisa do que métodos tradicionais na identificação da dor [18].

 

Outro benefício da IA é a automatização dos registros anestésicos, que facilita o monitoramento da recuperação dos pacientes e melhora a comunicação entre os profissionais de saúde [19,20]. Além disso, sistemas inteligentes ajudam a organizar o fluxo de trabalho nos hospitais, otimizando o uso de leitos e a eficiência das equipes médicas [21].

 

No entanto, o uso da IA na anestesia ainda tem desafios. Os modelos precisam ser treinados com dados de qualidade e sem vieses para que possam auxiliar os médicos de forma justa e eficaz [22,23]. Além disso, a decisão final sempre dependerá do julgamento humano, pois a relação entre médico e paciente envolve fatores que a tecnologia não consegue substituir.

 

O futuro da IA na anestesia é promissor. Ela pode facilitar o trabalho dos anestesiologistas, melhorar o atendimento aos pacientes e até contribuir para o ensino médico [24]. Por exemplo, sistemas podem analisar a prática dos anestesiologistas e oferecer sugestões personalizadas para aprimorar suas habilidades [1].

 

Ainda existem desafios a serem superados para a ampla implementação da IA na anestesia, como garantir a qualidade dos dados e desenvolver regulamentações adequadas para seu uso [25]. No entanto, se aplicada corretamente, a IA pode transformar a anestesiologia, tornando os procedimentos mais seguros e eficientes, sem substituir a expertise e o julgamento dos profissionais de saúde [22].

 

Referências:

  • Singhal M, Gupta L, Hirani K. A Comprehensive Analysis and Review of Artificial Intelligence in Anaesthesia. Cureus. 2023;15(9):e45038. Published 2023 Sep 11. doi:10.7759/cureus.45038.

  • Nepogodiev D, Martin J, Biccard B, Makupe A, Bhangu A; National Institute for Health Research Global Health Research Unit on Global Surgery. Global burden of postoperative death. Lancet. 2019;393(10170):401. doi:10.1016/S0140-6736(18)33139-8.

  • Meara JG, Leather AJ, Hagander L, et al. Global Surgery 2030: evidence and solutions for achieving health, welfare, and economic development. Int J Obstet Anesth. 2016;25:75-78. doi:10.1016/j.ijoa.2015.09.006.

  • Bellini V, Rafano Carnà E, Russo M, et al. Artificial intelligence and anesthesia: a narrative review. Ann Transl Med. 2022;10(9):528. doi:10.21037/atm-21-7031.

  • Gambus P, Shafer SL. Artificial Intelligence for Everyone. Anesthesiology. 2018;128(3):431-433. doi:10.1097/ALN.0000000000001984.

  • Obermeyer Z, Emanuel EJ. Predicting the Future - Big Data, Machine Learning, and Clinical Medicine. N Engl J Med. 2016;375(13):1216-1219. doi:10.1056/NEJMp1606181.

  • Sessler DI. Big Data–and its contributions to peri-operative medicine. Anaesthesia. 2014;69(2):100-105. doi:10.1111/anae.12537.

  • Maheshwari K, Ruetzler K, Saugel B. Perioperative intelligence: applications of artificial intelligence in perioperative medicine. J Clin Monit Comput. 2020;34(4):625-628. doi:10.1007/s10877-019-00379-9.

  • Bellman R: Uma introdução à inteligência artificial: Os computadores podem pensar? São Francisco, Boyd & Fraser Pub Co, 1978.

  • Glen JB. The development of 'Diprifusor': a TCI system for propofol. Anaesthesia. 1998;53 Suppl 1:13-21. doi:10.1111/j.1365-2044.1998.53s115.x.

  • Liberman MY, Ching S, Chemali J, Brown EN. A closed-loop anesthetic delivery system for real-time control of burst suppression. J Neural Eng. 2013;10(4):046004. doi:10.1088/1741-2560/10/4/046004.

  • Liu N, Chazot T, Hamada S, et al. Closed-loop coadministration of propofol and remifentanil guided by bispectral index: a randomized multicenter study. Anesth Analg. 2011;112(3):546-557. doi:10.1213/ANE.0b013e318205680b.

  • Wehbe M, Arbeid E, Cyr S, et al. A technical description of a novel pharmacological anesthesia robot. J Clin Monit Comput. 2014;28(1):27-34. doi:10.1007/s10877-013-9451-8.

  • Goudra BG, Singh PM, Chandrasekhara V. SEDASYS(®), airway, oxygenation, and ventilation: anticipating and managing the challenges. Dig Dis Sci. 2014;59(5):920-927. doi:10.1007/s10620-013-2996-z.

  • Hoskins SL, Elgjo GI, Lu J, et al. Closed-loop resuscitation of burn shock. J Burn Care Res. 2006;27(3):377-385. doi:10.1097/01.BCR.0000216512.30415.78.

  • Bodhey A, Nair A, Seelam S. SAFIRA pump: A novel device for fixed injection pressure and to control local anesthetic injection during peripheral nerve block. J Anaesthesiol Clin Pharmacol. 2023;39(1):146-147. doi:10.4103/joacp.JOACP_112_21.

  • Olesen AE, Grønlund D, Gram M, Skorpen F, Drewes AM, Klepstad P. Prediction of opioid dose in cancer pain patients using genetic profiling: not yet an option with support vector machine learning. BMC Res Notes. 2018;11(1):78. Published 2018 Jan 27. doi:10.1186/s13104-018-3194-z.

  • Gonzalez-Cava JM, Arnay R, Perez JAM, Leon A, Martin M, Jove-Perez E, Calvo-Rolle JL, CasteleiroRoca JL, Juez FJD, Garcia HP, AlfonsoCendon J, Gonzalez LS, Quintian H, Corchado E: Uma Máquina sistema baseado em aprendizagem para administração de medicamentos analgésicos. Conferência Conjunta Internacional SOCO'17-CISIS'17-ICEUTE'17 2017; 649: 461–70.

  • Devitt JH, Rapanos T, Kurrek M, Cohen MM, Shaw M. The anesthetic record: accuracy and completeness. Can J Anaesth. 1999;46(2):122-128. doi:10.1007/BF03012545.

  • Spring SF, Sandberg WS, Anupama S, Walsh JL, Driscoll WD, Raines DE. Automated documentation error detection and notification improves anesthesia billing performance. Anesthesiology. 2007;106(1):157-163. doi:10.1097/00000542-200701000-00025.

  • Devi SP, Rao KS, Sangeetha SS. Prediction of surgery times and scheduling of operation theaters in ophthalmology department. J Med Syst. 2012;36(2):415-430. doi:10.1007/s10916-010-9486-z.

  • Hashimoto DA, Witkowski E, Gao L, Meireles O, Rosman G. Artificial Intelligence in Anesthesiology: Current Techniques, Clinical Applications, and Limitations. Anesthesiology. 2020;132(2):379-394. doi:10.1097/ALN.0000000000002960.

  • Bellini V, Montomoli J, Bignami E. Poor quality data, privacy, lack of certifications: the lethal triad of new technologies in intensive care. Intensive Care Med. 2021;47(9):1052-1053. doi:10.1007/s00134-021-06473-4.

  • Bruppacher HR, Alam SK, LeBlanc VR, et al. Simulation-based training improves physicians' performance in patient care in high-stakes clinical setting of cardiac surgery. Anesthesiology. 2010;112(4):985-992. doi:10.1097/ALN.0b013e3181d3e31c.

  • Food and Drug Administration. Proposed Regulatory Framework for Modifications to Artificial Intelligence/Machine Learning (AI/ML)-Based Software as a Medical Device (SaMD) - Discussion Paper and Request for Feedback, 2019, pp 1–20.


* Alunas de doutorado - UnB - disciplina da Pós-Graduação